Nesta semana dedicada ao incentivo do hábito de visitar museus, o Museu da Diversidade Sexual de São Paulo não tem motivos para comemorar. A data, criada pelo ICOM (Conselho Internacional de Museus), marca 20 dias desde que uma decisão da Justiça levou ao fechamento temporário deste espaço destinado à arte, cultura, memória, acolhimento e valorização da comunidade LGBTQIA+.
Poderia ser uma data de celebração, tendo em vista que o Governo do Estado de São Paulo está realizando um investimento recorde em museus; e que o MDS está justamente implementando um projeto de expansão e fortalecimento, com a elevação do orçamento, o aumento da área física, a criação de um centro de referência e de um centro de empreendedorismo e outras medidas.
A suspensão do contrato de gestão com o Instituto Odeon interrompeu a abertura da exposição “Duo Drag”, que daria luz ao universo LGBTQIA+, mais especificamente a drag queens, movimento que através da arte desafia os padrões de gênero. Além disso, a interrupção das atividades também prejudica a expansão em curso e a preservação do patrimônio cultural da comunidade LGBTQIA+.
Fundado em maio de 2012, o MDS é o primeiro museu da América Latina devotado ao tema da diversidade sexual, contemplando as múltiplas identidades de gênero que constituem a sigla LGBTQIA+. A ação judicial aconteceu no exato momento da expansão e do fortalecimento da instituição. Trata-se de uma reação a tudo o que o museu representa de positivo e transformador.
Para Carlos Gradim, diretor presidente do Instituto Odeon, instituição gestora do MDS, não é de hoje que o museu sofre ataques. “O fechamento do Museu da Diversidade é uma perda para toda a comunidade LGBTQIA+ e a sociedade em geral. Não mediremos esforços para retomar, o quanto antes, as atividades deste equipamento vital para a dignidade e a promoção de direitos”, ressalta.
NOTA OFICIAL
Dados os novos acontecimentos, viemos a público esclarecer os ocorridos. Não é de hoje que o Museu da Diversidade vem sofrendo ataques. Vivemos tempos difíceis, que salientam ainda mais a importância da nossa luta.
A ação popular em detrimento do fechamento do Museu da Diversidade Sexual (MDS) partiu de um deputado, do qual aqui não citaremos o nome, que ainda em 2021, questiona o investimento da Secretaria de Cultura e Economia Criativa no Museu e também a idoneidade do processo de convocação pública de escolha da organização social a geri-lo. A ação teve decisão liminar proferida pela Juíza Carmen Cristina Fernandez Teijeiro e Oliveira, no dia 8 de abril de 2022, suspendendo o Contrato de Gestão entre o Instituto Odeon e a Secretaria de Cultura e Economia Criativa.
A Procuradoria Geral do Estado (PGE) apresentou recurso contra essa decisão liminar e, na última quinta-feira (28), o desembargador Bandeira Lins decidiu manter a decisão liminar. Diante disso, a Secretaria orientou o Instituto a fechar o Museu como forma de garantir o respeito à decisão judicial.
O Instituto demonstrará em juízo os prejuízos advindos da suspensão do Contrato de Gestão do Museu da Diversidade, e a sua capacidade e idoneidade para seguir à frente da gestão do Museu, seguro de que reverterá o entendimento do judiciário.
INVESTIMENTO NO MUSEU DA DIVERSIDADE
A Convocação Pública proposta pela Secretaria da Cultura previa um orçamento de R$ 30.198.169,00 para 60 meses de gestão (5 anos), distribuídos da seguinte forma: R$ 9.046.500,00 para o primeiro ano, que inclui a ampliação da sede de 110m2 para 540m2. Nos quatro anos seguintes, um orçamento que tem como média, R$ 5.287.917,25 por ano (ou R$ 440.659,77 mensais).
Todos os equipamentos geridos em modelo de OS ligados ao poder público têm seus orçamentos divulgados de forma pública. Uma análise comparativa entre os diferentes orçamentos de museus mostra que o montante destinado especificamente ao Museu da Diversidade Sexual está entre o menor deles.
CONVOCAÇÃO PÚBLICA DE ESCOLHA DA NOVA GESTÃO DO MDS
A seleção da organização social que faz a gestão do Museu aconteceu por meio de Convocação Pública que seguiu as normas aplicáveis, e não por meio de um processo de licitação. A decisão decorre de parecer técnico emitido pela unidade de museus da Secretaria de Cultura e baseado em critérios objetivos, que avaliou as propostas das entidades participantes. O procedimento cumpriu todas as exigências legais, levando à seleção da entidade com a melhor proposta técnica e orçamentária.
HISTÓRICO DE GESTÃO DO INSTITUTO
Entre os pontos chaves citados na decisão judicial para questionar a seleção, encontramos o rompimento do contrato para a gestão do Theatro Municipal de São Paulo, em face da reprovação das contas relativas ao ano de 2018, e a existência de ação de ressarcimento proposta pela Fundação Theatro Municipal contra o Instituto Odeon. Durante o trâmite de análise da prestação de contas, o Instituto Odeon seguiu na gestão do Theatro Municipal até outubro de 2020, quando enfim houve a rescisão do contrato.
Após a análise da prestação de contas final do Instituto Odeon, o único ponto ainda em aberto decorre do inadimplemento de um fornecedor que realizava o serviço de bilhetagem do Theatro e apropriou-se da receita de bilheteria. A Fundação entende ser responsabilidade do Instituto ressarcir esse inadimplemento de terceiro, posição da qual o Instituto discorda. Essa divergência encontra-se atualmente em discussão no judiciário e o Instituto Odeon irá respeitar e seguir o posicionamento da justiça sobre o caso.
Apesar da discussão judicial, a própria Fundação já se posicionou afirmando que não houve desvio por parte do Instituto, bem como que o mesmo não foi diretamente responsável pela apropriação dos valores. Não houve aplicação de qualquer penalidade que signifique a declaração de inidoneidade do Instituto ou a proibição de participar de chamamentos públicos ou celebrar parcerias e contratos com o Poder Público, em qualquer esfera.
O Instituto gere o Museu de Arte do Rio, com orçamento superior ao MDS, desde 2012, sem qualquer problema em suas prestações de contas. Da mesma forma, segue participando de editais em todo o Brasil, sendo declarado inclusive vencedor em alguns deles, sem que jamais sua idoneidade ou competência tenha sido colocada em dúvida.
SITUAÇÃO ATUAL E PRÓXIMOS PASSOS
O fechamento do Museu da Diversidade é uma perda para toda a comunidade LGBTQIA+, em um momento já tão difícil. Não mediremos esforços para retomar, o quanto antes, as atividades deste equipamento para continuar atuando como um aparelho de transformação social, na luta pela dignidade humana e promoção por direitos. Vamos reabrir em breve, com a força da exposição Duo Drag, que traz ainda mais luz ao trabalho dessas artistas, neste espaço que foi e sempre será, também delas.